quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Um homem parado, no carro, diante de um semáforo vermelho


 
            Aquela cor. Sim, aquela imprevisível cor primária. Aquela cor esmagadora...

            O tempo. Os afazeres. A realidade. Tudo se parecia amargamente unir ali, como uma barreira, uma fortaleza.

            Mas eu tinha de lá estar. Tinha de me identificar como presente. Senão, sentir-me-ia aprisionado por mim mesmo. Pela culpa. Pela verdade.

            E aquele imponente objeto inanimado, cuja missão consistia na emissão de luzes, parecia mais entusiasmado do que o ser humano lhe permitia, enquanto exercia a sua real função: impedir acidentes. Porquê, se ninguém passava por ali? Nunca ninguém passava por ali. Era triste aquela rua, tão solitária, tão impressionantemente solitária.

            Talvez deva agora, simplesmente, compreendê-lo. Talvez ele deseje vingança pela sua tão imutável e cruel solidão, a sua realidade. Aquele olhar intenso e revelador, o suor e sangue interiores e tão mortos, tão desfeitos. Tão invisíveis.

            Porquê? Porque é que o mundo é tão insensível? Porquê? Talvez, porque apenas as nossas sensações e sentimentos egoístas, prevalecem sobre a vontade imensa de ver sobre nós mesmos, sobre o nosso acalorado regaço...

            E o tempo que não para. Que não se deixa levar por exigências dos nosso ser rodeado de egoísmo. E a hora, e a altura que se imortaliza quando nos ausentamos do mundo, apenas por um milésimo de segundo. E a reunião. E o emprego. E a realidade.

            E esse Atraso, o dono e senhor das nossas mentes descuidadas, estaria para vir, para entrar como obriga ditatorialmente essa rotina incansável. Esse brilho no olhar. Esse problema sem solução.

            De súbito, renasce a vontade de me ausentar deste mundo e voltar ao meu interior. Onde o tempo vem e volta num único friccionar de dedos. Onde os momentos se esclarecem ou complicam. E vejo dois caminhos. Qual seguir? Qual o destino a que levariam? Apenas o pensamento poderia revelar a estrada pela qual optar. Apenas eu mesmo. Poder-se-ia determinar tudo ali, sem delongas. Cerrei a minha alma e apenas caminhei perante a fé iluminadora.

            E o semáforo deixou-se seduzir pela compaixão obtida, por todos os pacientes seres diante dele situados. A luz esverdeada deixou-se acontecer e um sorriso brilhante nasceu perante o nosso ser interior

            Cheguei a horas à reunião. Cheguei a casa, com a minha família pacientemente acordada. Apenas não cheguei a horas ao encontro que marcara no dia anterior com a minha própria alma. É a vida, o tempo e a realidade.

 

 
  Ricardo Guerra   6ºB
 
 
Campeonato Nacional de Escrita Criativa

 

 

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